18.7.15

uma noite de Sarau.

Ontem, dia 17 de julho de 2015, tive a alegria de estar presente no Sarau Origens, no Casarão Pau Preto.

Meu foco foi estar (de fato) presente e (de fato) escutar todos que se disponham ao centro para compartilhar algo. Tarefa simples, mas difícil. Por vezes as palavras soavam para mim como sons confusos de uma cidade e eu me embalava pela vibração, ritmo, volume e tom, perdendo totalmente a apreensão do sentido das palavras. Outras eu simplesmente dispersava e vageava em pensamentos tolos e, quando voltava a mim, tinha perdido o que tinha acontecido por alguns minutos. Eckhart Tolle compara esse estado a de um cachorro que sai farejando a calçada assim que o portão de casa se abre e, seguindo os cheiros diversos e interessantes, só se dá conta de si mesmo quando já está tão longe de casa que nem sabe mais voltar. Por sorte consegui voltar todas as vezes. Assim pude realmente escutar e ver muita coisa interessante e muita gente interessada. Um privilégio!

Na minha vez de (me) expor, procurei dar vazão a duas coisas que busco: ser espontâneo e autêntico. E claro, quero ser também interessante, mas pra isso acredito que antes é preciso ser interessado e, por isso, foco no meu próprio interesse de estar ali. Nesse sentido, fui mais ou menos desarmado (sempre temos cartas nas mangas, como bem sabem os mágicos que ali estavam) e deixei que acontecesse o que tivesse que acontecer. Eu só queria, basicamente, partir do silêncio, do vazio, pois é daí que tudo parte e é praí que tudo retorna. A partir disso pude compartilhar alguns anseios, pensamentos e medos, refletindo principalmente o ponto nevrálgico de nossa existência: a morte. E a ela eu junto mais duas: a respiração (que de certa forma é seu oposto direto) e a arte, afinal, estávamos ali por causa dela. Ou melhor, estávamos ali usando ela como desculpa para fortalecer o ENCONTRO - que é, ao mesmo tempo, causa e consequência da própria arte.

E o que fiz foi arte? Foi artístico? Foi uma enrolação? Foi carência?

Há muito se discutem os limites entre vida e arte. Creio que para começar a discutir essa relação precisaríamos primeiro saber o que de fato é vida e o que de fato é arte. Isso já levaria uma vida toda. Mas tenho uma certeza calma de que tudo está unido demais para enxergamos de maneira pura. No meu discurso improvisado (era isso, afinal) falei que a arte conduziria, paradoxalmente, ao fim da arte. A arte levaria a não-arte. Assim, seríamos artistas em busca de nos tornarmos não-artistas. Em busca de retomarmos a fonte energética da própria vida que, por vezes, nos parece tão distante. No limite, em busca de nós. Seria isso o ser artista?

Eis Artaud: “Tenho uma única ocupação: refazer-me!”.

Queremos, no âmago, a eclosão da verdade. Queremos a revelação! Algumas linhas de filósofos gregos (como os cínicos, por exemplo, na figura emblemática de Diógenes) enfatizaram a necessidade de colocar em prática o pensado, ou melhor, fazer a filosofia acontecer. Não será assim que nós, artistas, devemos fazer com a arte? Um Sarau é um momento-lugar simbólico de translocar a arte para o cotidiano, para o trivial, para o humano. O mais belo nessas ocasiões é a oportunidade de nos vermos. E tudo é tão cru!

Falei ontem do Allan Watts, que estou lendo sua auto-biografia e me confundindo com ele. Watts era um grande orador e, ainda assim, alguém que parecia entender o silêncio como um mestre zen (que de fato o era, apesar de seu jeitão ocidental debochado). Uso algumas de suas palavras para terminar tudo com o escárnio que a vida merece: "Pergunto-me: por que não podemos deixar de rir diante do fato de nenhum de nós existirmos de verdade, e de que a concretude rude de todos os fatos nus e crus a se encarar é uma exibição energética do nada?".

Somos artistas, somos humanos. Somos nada.

Um comentário: